Rifa-se um coração
Rifa-se um coração quase novo
Quase puro
Um coração idealista sonhador como poucos
Um coração à moda antiga
Um coração sacana indeciso impreciso
inconsequentemente inocente…
um coração que mesmo não acreditando em si próprio
nunca desiste de acreditar nos outros
Rifa-se um coração que nunca aprende
Que não endurece que se dá que se oferece a quem o queira maltratar
Um coração insensato que comanda o racional
Um louco suicida que vive procurando
relações e emoções verdadeiras
sem saber ao certo o que raio quer isso dizer afinal
senão o coração a bater em desalinho sem caber no peito
Rifa-se um coração que insiste em cometer
os mesmos estúpidos erros de sempre
Esse coração que erra, briga, sangra, grita
e se arrepende de excessivo que é…
Este coração tantas vezes incompreendido
Tantas vezes provocado
Tantas vezes impulsivo
Rifa-se este desequilibrado emocional
que só dá trabalho e que ocasionalmente
abre sorrisos tão largos que quase dá
pra engolir as orelhas duma ponta à outra
mas que normalmente só consegue
arrancar lágrimas em catadupa
rifa-se um coração piegas
um pobre diabo
que não sabe
ou não quer
se defender
porque se mostra sem armaduras
peito aberto ao mundo
Rifa-se um coração, ou mesmo troca-se por
outro que tenha um pouco mais de juízo
que não maltrate tanto o ser que o abriga.
Rifa-se um coração cego, surdo e mudo,
um selvagem que incomoda um bom bocado
Oferece-se um coração vadio, cheio de defeitos
sem raça, sem pedigree.
Um simples coração alienígena.
adaptação minha dum texto d Clarice Lispector
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